Inconstitucionalidade do IRPF sobre pensões alimentícias

Mudanças de normas e paradigmas de tributação

Todo início de ano o contribuinte volta a se deparar com a complexidade do Sistema Tributário Nacional. Os impostos de periodicidade anual batem à porta e muitas vezes carecemos do devido entendimento sobre eles. IPVA, IPTU e, sobretudo, o Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) são os principais exemplos dessas cobranças.

Apesar da simplificação de alguns tributos, o IRPF continua gerando muita dúvida, principalmente, no preenchimento da Declaração de Ajuste Anual, prevista, após nova prorrogação, para o final do mês de maio. Desta forma, todo cidadão que recebeu rendimentos em valores superiores a R$ 28.559,70 ou ganhou mais de R$ 40 mil em rendimentos isentos, não tributáveis ou tributados na fonte em 2021 está obrigado a entregar a declaração.

Independentemente disso, a fluidez científica do Direito Tributário nos contempla com uma constante mudança de normas e de paradigmas de tributação, e o Judiciário é cada vez mais protagonista neste movimento. Em 2021, os Tribunais Superiores (STF e STJ) foram responsáveis pela fixação de diversas teses orientadoras da atividade jurídica.

 

O tratamento tributário aos valores recebidos a título de pensão alimentícia

Torna-se especialmente interessante o tratamento tributário aos valores recebidos a título de verba alimentar com lastro no Direito de Família, comumente denominados pensão alimentícia. No ano passado, teve início no Supremo Tribunal Federal o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5.422, que questiona a constitucionalidade da incidência de IRPF sobre esses valores recebidos pelos alimentandos. A tese do contribuinte se sustenta, em síntese, na natureza dos valores, que teriam como fundamento garantir o mínimo existencial do alimentando, fazendo frente a suas necessidades materiais básicas. Desse modo, os valores estariam completamente afastados da concepção de aumento patrimonial e não seriam capazes de revelar capacidade contributiva, devendo ser excluídos da base de cálculo do IRPF.

Apesar de ter havido formação de maioria favorável à tese por unanimidade, o Ministro Gilmar Mendes pediu destaque, o que basicamente fará com que a contagem dos votos se reinicie em data ainda incerta.  Tudo indica que ainda em 2022 operar-se-á o desfecho do caso, abrindo enorme possibilidade para que o contribuinte que recebe tais valores possa ingressar em juízo para pleitear sua restituição.

 

Precedentes sobre a mesma matéria

Outro caso emblemático acerca da mesma matéria foi o Recurso Especial nº 1.470.443/PR (Tema Repetitivo 878 do STJ), decidido no final de 2021. No julgamento, o Superior Tribunal de Justiça consignou três teses relacionadas entre si: (i) reafirmou a regra geral pela incidência do IR sobre juros de mora devidos em pagamentos em atraso, uma vez que possuem natureza de lucro cessantes; (ii) consignou exceções a tal regra, como no caso do pagamento de verbas alimentares a pessoa física, cuja natureza de danos emergentes impede a incidência de IR sobre os juros de mora; (iii) da mesma forma, quando os valores percebidos estiverem fora do campo de incidência do imposto, não haverá que cogitar tributação dos juros, por serem entendidos como valores acessórios.

 

Críticas e teses em discussão no caso

A doutrina se preocupa com a possibilidade de dupla isenção criada pela Jurisprudência, uma vez que o alimentante já pode deduzir os valores pagos a título de pensão alimentícia em sua declaração anual, o que faria com que os valores não fossem ofertados à tributação em absoluto em caso do reconhecimento da isenção em benefício dos alimentandos. De toda sorte, a discussão sobre os efeitos arrecadatórios da decisão não foi amplamente debatida pelos Tribunais e provavelmente será objetivada em pronunciamentos futuros da própria Receita Federal.

Verdade é que ambas as teses indicam como os Tribunais Superiores têm, nos últimos anos, se inclinado a garantir um tratamento mais benéfico ao contribuinte que percebe valores oriundos do Direito de Família, como a pensão alimentícia. Apesar de ainda subsistir a tributação de tais valores pelo IRPF, o Supremo dá um claro indicativo da possibilidade de mudança da situação e, concomitantemente, o Superior Tribunal de Justiça, ao excluir os juros de mora da hipótese de incidência tributária, reflete a possível tendência jurisprudencial da desoneração de tais verbas.

Dentre todos os ramos do Direito brasileiro, o Direito Tributário é, sem dúvida, o mais ativo e mais alarmante, seja por suas abruptas mudanças promovidas pela lei e pela jurisprudência, seja pela sua importância na macro e na microeconomia. Para tanto, o Frederico & Magri Advogados está atento a todas as nuances do ordenamento jurídico e disposto a auxiliar a condução dos seus negócios e de seu patrimônio da forma mais eficaz possível.

Guilherme Sivieri Pompeu de Sousa Brasil

Bacharel pela Faculdade de Direito da USP, com período de intercâmbio na Universidade Luigi Bocconi, em Milão. Possui experiência no setor privado e é responsável pela área tributária do escritório. Atua principalmente com demandas envolvendo questões tributárias, imobiliárias e planejamento patrimonial e sucessório.