PL nº 511/2020 e redução da carga tributária

Nos últimos dias de 2022, a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (ALESP) aprovou, em regime de urgência, o Projeto de Lei nº 511/2020, por meio do qual reduziu as alíquotas do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) no estado.

De acordo com o projeto, a atual alíquota de 4% seria reduzida para 0,5% nos casos de transmissão por doação e para 1% nos casos de transmissão por sucessão mortis causa, ou seja, em decorrência de falecimento.

A drástica redução na carga tributária vai de encontro às notícias exaradas pelo próprio Poder Legislativo, que conta com projetos para incremento das alíquotas e instituição da técnica de progressividade.

Nos termos do processo legislativo paulista, o projeto segue seu trâmite e está nas mãos do governador do estado para sanção, que deverá se manifestar sobre sua aprovação ou rejeição.

Caso a proposta seja aprovada, a lei entrará em vigor imediatamente, sendo desnecessária a observação de qualquer período de anterioridade, pois versa sobre redução da carga tributária e não sua majoração ou instituição de tributo novo. Contudo, não há que se cogitar em aplicação retroativa das novas alíquotas, que apenas incidirão sobre fatos geradores prospectivos, isto é, apenas para as doações realizadas ou as sucessões abertas após a promulgação da lei.

 

Possibilidade de veto à proposta

Apesar da excitação inicial trazida ao contribuinte, o governo do estado vê a norma com grande desconfiança, uma vez que acarretaria o custo aproximado de R$ 4 bilhões à Fazenda Pública, além de não estar previsto na lei orçamentária. Com isso, já existem recomendações por parte da Secretaria de Fazenda e da Procuradoria-Geral do Estado no sentido do veto.

Da mesma forma, no início de janeiro de 2023, o governador informou a imprensa de que iria acatar as orientações técnicas e vetar o projeto.

Caso assim proceda, a proposta retornará à ALESP, nos termos do artigo 28, §5º da Constituição Estadual para apreciação dos motivos e deliberação. A casa terá trinta dias para acatar ou rejeitar o veto, aprovando nesse último caso o texto original.

 

Perspectivas

De um lado, defende-se o projeto como forma de redução da carga tributária e dos custos da vida em sociedade; do outro, a lei supostamente seria promotora de injustiça social e fiscal por meio da desoneração das parcelas mais abastadas da população.

De uma forma ou de outra, há fortes indícios de que a legislação não será modificada e alíquota manterá seu valor nominal, de 4%. Contudo, essa moção nos permite refletir sobre algumas questões que permeiam o contemporâneo planejamento tributário e sucessório.

Primeiro, deve-se abandonar a visão de que organização patrimonial familiar seria restrita a um grupo seleto de pessoas com bens exorbitantes. Em verdade, planejamento e gestão consciente de riqueza é um serviço essencial à manutenção das capacidades econômicas de qualquer família brasileira.

Segundo, não é plausível ou financeiramente adequado aguardar o falecimento de nossos entes queridos para delinearmos planos de ação e de organização patrimonial. A legislação atual conta com instrumentos que permitem, ainda em vida, a transmissão da propriedade, e dos demais direitos que a compõem, de quaisquer bens.

Nesse ponto específico, ressaltamos a antecipação da legítima, por meio da qual realiza-se a transmissão da herança ainda em vida; a doação com reserva de usufruto, por meio da qual o proprietário transmite a seus herdeiros uma parcela dos direitos sobre o bem e consegue dividir o recolhimento do tributo em duas fases (2/3 quando da doação e 1/3 quando da extinção do usufruto); a instituição de um “trust”, o PGBL, o VGBL etc. Não faltam instrumentos permitidos pelo ordenamento e cada situação concreta revelará a melhor forma de planificar a ação.

Por fim, planejamento patrimonial e sucessório não é apenas sinônimo de economia tributária, mas é também ferramenta que se revela amplamente exitosa em reduzir as contendas no seio familiar e nas gerações vindouras.

Todo este contexto escancara a dinamicidade do Direito Tributário no Brasil contemporâneo e a relevância de contar com bons consultores jurídicos.

Guilherme Sivieri Pompeu de Sousa Brasil

Bacharel pela Faculdade de Direito da USP, com período de intercâmbio na Universidade Luigi Bocconi, em Milão. Possui experiência no setor privado e é responsável pela área tributária do escritório. Atua principalmente com demandas envolvendo questões tributárias, imobiliárias e planejamento patrimonial e sucessório.