Mudanças nas Ofertas Públicas de Valores Mobiliários

A edição, pela Comissão de Valores Mobiliários, de novas Resoluções sobre ofertas públicas trouxe relevantes alterações no setor. Em linha com os pontos focais de transparência sempre crescente ao investidor, facilitação administrativa para a CVM e síntese documental no tocante ao registro das ofertas, o órgão reafirmou seu compromisso com a dinamicidade típica do mercado de ofertas primárias e secundárias de valores mobiliários.

Para novos emissores, ou agentes do mercado que buscam diversificar sua carteira, especialmente investidores profissionais com experiência em ofertas públicas de esforços restritos, as normas referidas apresentam alterações que devem ser conhecidas, a fim tanto de facilitar sua implantação quanto providenciar novas possibilidades para tais agentes. Ao mesmo tempo, algumas de suas características, como, por exemplo, a nova obrigatoriedade de registro de oferta, merecem especial atenção. Conheça algumas dessas mudanças:

 

Para os agentes ligados à emissão e oferta

A Resolução 160 da CVM, que substituiu as normas anteriores tanto sobre ofertas públicas regulares quanto ofertas públicas com esforços restritos, possui como objetivo também a facilitação de acesso ao mercado por parte dos emissores. Assim, empresas securitizadoras, fundos de investimento e agentes financeiros poderão se beneficiar de redução em seus custos de transação e maior incentivo à realização da oferta, especialmente, por meio de algumas mudanças chave:

  • Com a extinção da distinção entre ofertas públicas e ofertas públicas com esforços restritos, adveio a necessidade de registro perante a CVM para todas as ofertas. Tal necessidade não busca ser, porém, representativa de entraves adicionais ou demora excessiva para os emissores, uma vez que referida norma criou a possibilidade de registro segundo dois ritos distintos. O Rito Automático, cujo viés é o mesmo da anterior “oferta restrita”, é o aplicável a determinados produtos (como debêntures conversíveis e ofertas de ações subsequentes), emissores (emissor frequente de valor mobiliário de renda fixa, no tocante a títulos de dívida própria como, por exemplo, debêntures não conversíveis), e público alvo (que não mais é restrito a investidores qualificados). A oferta pelo Rito Automático, apresentando diversas vantagens operacionais (como o deferimento do registro por meio do protocolo dos documentos necessários) é, porém, apresentada pela Resolução 160 como excepcional, de acordo com os casos em que é aplicável. Nesse sentido, o Rito Ordinário, que necessita de prévia aprovação da CVM, apresenta-se como o procedimento regular para a maior parte das ofertas. Tal rito, também de acordo com a intenção da CVM de conferir mais dinamicidade a uma oferta que, no mais das vezes, será a inicial para aquela modalidade de valor mobiliário (leia-se, IPO), conta com novas e distintas possibilidades de publicização das características da oferta para investidores.
  • A simplificação e categorização dos modelos de prospecto, adaptados ao valor mobiliário ofertado, é outra alteração que facilita e dinamiza o ingresso de novos emissores. Com a nova norma, também se priorizou a transparência aos investidores no tocante às características de mercado do produto, por meio da chamada lâmina de oferta, padronizada e com intuito informativo mais direto.
  • Ainda, no tocante à captação de investidores profissionais, foi retirado o número máximo possível para realização da consulta preliminar ao mercado, ou pilot fishing. Tal consulta preliminar, de acordo com a Resolução, poderá também ser realizada por agentes intermediários do mercado ligados ao ofertante.

Tais mudanças, somadas a outras de interesse dos emissores (como a expansão do rol de instituições aptas a figurar como coordenadoras da oferta, e alteração no período de silêncio), providenciam importante marco na dinamização de sua organização e planejamento de oferta.

 

Para os investidores

Do ponto de vista dos investidores, para além dos novos requisitos visando a providenciar maior transparência das características da oferta, merecem destaque dois elementos alterados:

  • Na fase de bookbuilding, isto é, consulta de mercado para aferição do valor mobiliário a ser ofertado (precificação), a nova norma prevê a possibilidade de participação não apenas de investidores profissionais, mas também de investidores qualificados, nos casos de ativos representativos de títulos de dívida.
  • No caso de ofertas às quais seja aplicável o Rito Automático, os investidores devem ter em mente que o rol de acesso à oferta não mais possui limitação numérica, medida que visa à expansão da publicidade da oferta no mercado. Em consonância com isso, a extinção tanto dos períodos de cool-off quanto de lock-up, em relação a uma mesma modalidade de valor mobiliário e emissor, proporcionam maior dinamicidade e competitividade ao ofertante, fato para o qual o investidor a ele relacionado deverá se atentar.

 

Conclusões

Por mais que as novas Resoluções da CVM entrem em vigor apenas em janeiro de 2023, emissores, coordenadores, ofertantes e investidores devem planejar com antecedência suas posições e estratégias a respeito das alterações ocorridas. Nesse sentido, e considerando a necessidade dos agentes de mercado de adequarem suas operações ao Rito a ser praticado perante a CVM, imprescindível a assistência de consultores jurídicos especializados, com vistas a aconselhar e, eventualmente, readequar operações planejadas e em curso às novas especificidades disciplinadas pela CVM.

Enzo Rocha Magri

Bacharel e doutorando em direito civil pela Universidade de São Paulo – USP. Possui experiência em demandas consultivas e contenciosas envolvendo responsabilidade civil contratual e extracontratual, direito societário, contratos empresariais, mercado de capitais e direito bancário. Sua área de pesquisa e especialidade é a responsabilidade civil, especialmente a relativa aos danos materiais e morais.